No Dia da Visibilidade Lésbica reafirmamos nossa disposição de seguir em luta, sem recuar jamais

Hoje (29) celebramos o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica para marcar nossa existência e também pautar debates sobre políticas de combate à lesbofobia. Uma das nossas ferramentas de luta é a ocupação de espaços de poder e, apesar de sermos poucas, avançamos na representatividade de mulheres orgulhosamente LBTs nas assembleias e câmaras pelo país. E esse avanço incomoda.

Nas últimas semanas, eu e outras companheiras que ocupam mandatos parlamentares, recebemos ameaças. Em apenas uma semana recebi no e-mail institucional duas mensagens: a primeira foi no dia 8 de agosto e traz referência direta a minha sexualidade, exigindo que renuncie ao cargo, ou sofreria um atentado. A mensagem também cita outras parlamentares, como a vereadora de Belo Horizonte Cida Falabella (PSOL), e as deputadas federais Dandara Tonantzin (PT) e Duda Salabert (PDT). Ao fim do e-mail, os criminosos usam o slogan da campanha bolsonarista “Deus, Pátria, Família”, lema criado pelo fascismo italiano e usado pelo integralismo no Brasil.

Já no dia 14 de agosto, recebi um novo e-mail, de conteúdo semelhante, desta vez, com ameaças de “estupro corretivo”. Esta ameaça foi recebida no mesmo dia, de forma coordenada, pelas vereadoras do PSOL de Belo Horizonte, Cida Falabella e Iza Lourença. O fato foi registrado junto à Polícia Legislativa e à Polícia Civil, que já estão investigando o caso.

As companheiras Mônica Benício (PSOL), Rosa Amorim (PT) e Daiana Santos (PCdoB) também foram ameaçadas nos últimos dias. Somos mulheres orgulhosamente LBT e de esquerda, ocupando cargos políticos para promover não apenas a visibilidade, mas para atuar firmemente e criar políticas públicas de real impacto na vida do povo trabalhador. As recentes ameaças fundamentalistas também foram direcionadas ao Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos), uma organização da sociedade civil que luta pelos direitos da população LGBT+; e mais recentemente para a deputada Lohanna França (PV), em uma explícita tentativa de intimidar as lutas das mulheres e pela diversidade.

Além de morte, muitos desses textos trazem ameaças de “estupro corretivo”, no absurdo discurso de que o estupro corrigiria a sexualidade das mulheres lésbicas e bissexuais. No Brasil, somamos uma imensa dificuldade na consolidação de dados de violência contra as mulheres LBT, com a subnotificação geral de casos de estupros, e com o fato que não há registros oficiais de estupro corretivo. Ou seja, são diversos fatores que geram uma subnotificação dos casos e atrapalham a real dimensão do problema para o enfrentamento eficaz com ações do Estado.

Um dos poucos estudos na área é o Dossiê sobre o Lesbocídio no Brasil, feito pelo grupo de pesquisa Lesbocídio, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O trabalho aponta que, em 2017, foram 54 lésbicas mortas no país e que cerca de 3% desses casos houve estupro seguido de assassinato.

As ameaças coordenadas são uma expressão aguda de sintomas cotidianos no nosso país como a violência política de gênero e a promoção de ódio feita por bolsonaristas sobretudo contra mulheres, pessoas LGBT+, negros e indígenas.

Com a trágica experiência do governo Bolsonaro, os grupos de extrema direita se fortaleceram e o discurso de violência foi “normalizado”. Foram incontáveis as falas misóginas e LGBTfóbicas proferidas por bolsonaristas em espaços institucionais de política. Essa violência política gera uma autorização implícita para a violência também fora do parlamento.

Nos ameaçam porque somos uma ameaça ao sistema político que até hoje é majoritariamente comandado por homens brancos e ricos, muitos vindos de famílias políticas, em uma linha histórica que remonta ao Brasil escravocrata. Nossa diversidade, a defesa dos direitos humanos, do meio ambiente, da população em situação de rua, da comunidade LGBT+, das ocupações urbanas, dos movimentos sociais é uma ameaça à concentração de poder nas mãos daqueles que representam a velha política de sempre.

Vale lembrar que no Brasil a Lei 14.192/2021 estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher no exercício de direitos políticos e de funções públicas. Pela lei, toda ação, conduta ou omissão para impedir ou restringir os direitos políticos das mulheres é considerada violência política.

Para frear esse movimento em Minas Gerais, uma medida fundamental é a aprovação do Projeto de Lei 2.309/20, de iniciativa coletiva das deputadas Ana Paula Siqueira, Andréia de Jesus, Beatriz Cerqueira e Leninha. O PL cria o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política contra a Mulher que estabelece formas de prevenção e enfrentamento a esse tipo de atitude violenta. Mesmo com obstrução pela extrema direita, o projeto segue em tramitação e em breve estará pronto para ser votado em Plenário. Acredito que todos aqueles que defendem a democracia devem pressionar para que essa votação aconteça o quanto antes, porque esses ataques não são apenas contra nós, parlamentares, mas contra a representatividade da diversidade do povo brasileiro.

Esses fascistas querem nos matar e nos obrigar a retroceder, mas nós não vamos recuar. Estamos tomando as medidas de segurança necessárias, e não permitiremos que atrapalhem um mandato popular e combativo.

Seguiremos ocupando a Assembleia de Minas Gerais e o território mineiro com o orgulho de ser quem sou, com a alegria de promover projetos de lei e audiências públicas relevantes para a população periférica, trabalhadores, mulheres e comunidades tradicionais, e com a ousadia de quem não tem medo de lutar.

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